Investimentos na China: fundamentos reforçam o ponto de entrada — invista antes do rally
Entenda por que a China continua sendo uma tese estratégica para investidores de longo prazo e como aproveitar esse momento no cenário global

Quem anda me acompanhando nos últimos dois anos sabe que eu estou fascinada com a China. Começou como um flerte casual quando vi a Bolsa de Shenzhen cair mais de 45% no pós-pandemia. E eu adoro uma boa barganha, principalmente quando vem de narrativas equivocadas que o mercado financeiro insiste em entrar.
No pós-pandemia, a economia chinesa foi dada como morta depois de uma grave crise imobiliária. Os chineses, por falta de liberdade de investimentos e diversificação, investiam em imóveis para garantir sua aposentadoria. Mas o excesso de investidores causou uma bolha de novas construções que estourou quando o preço do imóvel caiu.
Até aí, eu fui…
O que levou o mercado a subestimar a China?
Realmente, tivemos investimentos pesados no setor de construção, estimulados por uma oferta que não encontrava respaldo na demanda por esses imóveis.
Empresas quebraram, o setor colapsou e, sendo um dos principais motores do crescimento chinês até então, provocou uma queda das projeções de atividade. Como já tivemos no Japão, como já tivemos nos EUA na crise do subprime, e como já tivemos em qualquer economia desenvolvida…
Mas, depois da crise imobiliária, o mercado passou para uma narrativa de esgotamento do modelo de crescimento chinês. Agora, a China seria o novo Japão, cujo crescimento nunca mais viria e, ao contrário de todos os países do Ocidente, nunca mais se recuperaria economicamente dessa crise, pois o setor imobiliário era o motor do crescimento chinês.
Ahhh pera aí…isso não… não aceito! Foram longe demais.
Para mim, isso evidencia um completo desconhecimento da economia chinesa e de décadas de história econômica e política.
A nova estratégia econômica chinesa
Primeiro, a China é uma ditadura. Goste você ou não de regimes ditatoriais, o fato é que o governo não precisa pensar em reeleição a cada quatro anos…
(Sei que te incomodou eu falar tão levianamente sobre uma ditadura, mas você precisa considerar aqui que não cabe a um analista financeiro julgar o tipo de regime político e social de outras economias, e sim procurar por oportunidades de investimento. Para ficar claro, eu não gosto de regimes ditatoriais).
…Voltando…
Em um regime desses, eles podem se dar ao luxo de pensar estrategicamente nos próximos 10 ou 20 anos de investimentos. Os membros do governo são escolhidos por mérito, e seus resultados devem ser comprovados com anos de gestão eficiente de cidades menores. Bem distante do nosso sistema eleitoral brasileiro, não é mesmo?
Além disso, nas últimas quatro décadas, eles fizeram investimentos pesados em logística e se tornaram o país mais eficiente do mundo em transporte e exportação de bens industriais.
Como se não bastasse, fizeram também uma revolução educacional, preparando seus cidadãos para os empregos da nova economia. Diferentemente da nossa educação, que ainda ensina química orgânica nas escolas e modelo CAPM nas faculdades de economia. Não sabe nem do que eu estou falando? Pois é, é irrelevante mesmo, não se preocupe.
Investiram pesado em tecnologia, inteligência artificial, chips, painéis solares, carros elétricos e qualquer coisa da nova economia que você possa imaginar. Hoje, a China compete de igual para igual com os EUA nas fronteiras da tecnologia, tem seus modelos de IA, smartphones, compete com os carros europeus, os eletrônicos japoneses, e assim vai.
“Ahhh, Marília, mas com a eleição de Trump e a guerra comercial entre China e EUA, será o fim da China. Aliás, a Índia será a nova China”, diziam os economistas.

Comparativo: China x Índia
Olha, a Índia pode sim ser alvo de muitos investimentos e sofisticação no futuro, mas para isso, pode botar algumas boas décadas para frente.
Eu mesma conheci a Índia em outubro de 2013, logo após o superciclo de commodities.

O Taj Mahal está certamente entre as coisas mais lindas que meus olhos já viram nesta vida!
Mas a Índia está a anos-luz da China. Naquela época, estradas que interligavam cidades principais eram ainda de terra, as cidades eram sujas e bagunçadas, as pessoas pulavam dentro e fora dos ônibus sem organização urbana, e o sistema de castas marginalizava uma parte da população.
De lá para cá, muitos investimentos foram feitos e a Índia se modernizou bastante. Mas a cultura segregada e a religiosidade ainda dificultam uma mão de obra qualificada em larga escala. E a logística não passa nem perto da China.
A China é um parque industrial enorme com mão de obra barata e qualificada. Se antes o país atuava apenas em produtos de baixa complexidade, hoje ele disputa tecnologia e serviços de tecnologia de ponta com gigantes globais. Não há alternativa viável.
A cultura chinesa é a do trabalho. Se não trabalhar, não come. Não há espaço para assistencialismo. A China juntou o que há de melhor em várias culturas ao redor do mundo.
A grande falha do país está na liberdade e nos direitos do cidadão, que, por mais que você possa argumentar que o preço é alto demais, fato é que isso não prejudica a economia.
Pois me parece uma piada acreditar que o modelo de crescimento econômico chinês se “esgotou". Pois não há nada que me faça acreditar que um mercado de trabalho abundante e qualificado, juntamente com uma logística invejável, seja inútil para a competição global. A China respira desenvolvimento.
Há 10 anos, diversos economistas riam das “cidades-fantasma” que os chineses tinham construído, ligando “nada com lugar algum". Hoje, essas cidades são entupidas de gente, organizadas, pujantes e propositais.
Nossa mentalidade ocidental não consegue lidar com um pensamento de desenvolvimento para daqui a 10 anos. Só pensamos no hoje e apagamos incêndios.
A China está muito na nossa frente. O país está, inclusive, correndo, enquanto os EUA decidiram andar para trás.
O impacto da China na nova ordem mundial
Em 2025, os Estados Unidos devem manter sua posição como a maior economia do mundo em termos de PIB nominal, com uma projeção de US$ 30,51 trilhões, enquanto a China se mantém como a segunda maior, com US$ 19,23 trilhões. Muitos economistas acreditam que a China se tornará o país número 1 em PIB na nova ordem global. Eu me incluo nessa! Com mais alguns anos, a China vai comer os EUA no jantar!
Os EUA eram, antigamente, o país da oportunidade, do trabalho e da ascensão social. Agora eles viraram inimigos do mundo, protecionistas e, internamente, assistencialistas. O déficit fiscal é enorme, a máquina ficou grande demais, as empresas viraram “too big to fail” e ninguém fala em ajuste fiscal. As tarifas vão aumentar a inflação local e, certamente, não vão fazer crescer a produtividade.
Para os amantes de investimentos nos EUA, sinto muito, mas estamos no início de uma longa era de decadência americana. Isso significa que a Bolsa americana não vai mais subir? Não. Mas, do ponto de vista econômico, o dólar não será mais a moeda mais procurada.
Aliás, já não é. Quando olhamos para as grandes reservas cambiais do mundo, já vemos uma tentativa de diversificação do dólar.

Podemos ver essa tendência também no preço do ouro e do preço do bitcoin. E a tendência de diversificação de reservas vai continuar.
Por outro lado, o Yuan vem ganhando muito espaço. A China vem trabalhando em acordos bilaterais de comércio e transações com várias economias, o que vem deixando os EUA bem bravos. A estratégia inicial era “comer pelas beiradas", mas o tarifaço do Trump acelerou a necessidade de diversificação dos EUA.
Recentemente, até a Bolsa de países emergentes foi alvo de investimentos para diversificação. E esse tipo de ativo é tão pequeno e tem a liquidez tão baixa que um pequeno ajuste de alocação já fez a nossa Bolsa ir de 100 para 140 mil pontos.

É importante frisar que investir “cegamente” nos EUA passa a ter um risco não desprezível: a dívida americana.
Dívida dos EUA: um risco difícil de ignorar
Cerca de um terço da dívida pública dos Estados Unidos é detida por investidores estrangeiros. Essa porcentagem corresponde a aproximadamente US$ 7 trilhões, de um total de mais de US$ 29 trilhões em títulos negociáveis emitidos pelo governo americano. Os principais credores estrangeiros são Japão, Reino Unido e China.

Podemos ver pelo gráfico cinza que o percentual da dívida americana carregada por gringos segue crescendo e atinge a máxima histórica de mais de 30%. Ou seja, os americanos dependem dos gringos para financiar sua dívida pública. Por outro lado, eles estão loucamente impondo tarifas a esses países, que começaram timidamente a reduzir sua exposição aos EUA. Percebe o risco?
A China, por outro lado, também tem uma dívida grande e crescente, mas quase 100% financiada por poupança interna. E boa parte dessa dívida financia investimentos, com 43% do PIB. Já nos EUA, a formação bruta de capital fixo gira em torno de 20%, metade da China.
E nós, brasileiros, sabemos bem que, se em algum momento os EUA precisarem resolver o problema fiscal deles, certamente os investimentos seriam os primeiros a minguar.
Sobre o PIB chinês, a piora do crescimento veio justamente do governo ter deixado o setor imobiliário quebrar, sem estimular um setor ineficiente, como os EUA fizeram na crise do subprime, sem gerar moral hazard. Do contrário, a China anunciou investimentos em setores estratégicos para o futuro, como data centers, IA, automóveis elétricos, placas solares, entre outros. Essa mudança organizada de recursos entre os setores só dá para ser feita em um país ditatorial planificado.
“Mas, Marilia, por que você está falando tanto da China?”
Olha, parte é porque estou muito empolgada mesmo, e acho que, quando os dados econômicos virarem, teremos um baita rally por lá. Essa é a grande tese que construí depois de dissecar bastante o assunto durante nossos encontros do Clube Nord.
Mas quero chamar a atenção de vocês para outra coisa, que as pessoas parecem não reparar.
A rêmora da China
A China é a grande baleia do crescimento mundial e a maior promessa para o futuro. Mas colada na baleia sempre vem a rêmora. Aquele peixinho que cola suas ventosas no grandão e vive das rebarbas, nadando sempre colado.
No último grande ciclo de crescimento chinês (2003-2008), vários emergentes viram suas moedas e Bolsas de Valores disparar.
Dentre eles, adivinha quem? Sim, nosotros!!!
Nós somos a rêmora da China. Somos um importante parceiro comercial chinês. Se a China crescer novamente, não tem como a gente não ir na rebarba. Não tem como!
Eu sei que você lê bastante jornal e procura se informar, e, quando lê, fica muito decepcionado com o Brasil. É violência, corrupção, crise política.
Dá vontade de largar tudo e ir morar fora, e investir tudo nos EUA. Eu sei!
Mas a minha provocação aqui neste artigo é fazer você olhar a floresta e não a árvore.
Enquanto está preocupado com o STF, tem uma mudança grande da ordem mundial acontecendo, que vai arrastar tudo o que tiver por perto. Se o Brasil fizer a lição de casa, vai aproveitar melhor essa fase. Se não fizer, vai crescer de rebote do mesmo jeito.
Como a China pode beneficiar o Brasil neste momento
De 2003 a 2007, durante o superciclo de commodities e o governo Lula, a Bolsa subiu 413%. Isso aconteceu durante o Mensalão, entende? Se pegarmos o final de 2002 até a máxima de 2008, teríamos incríveis 778% de alta, ou 47% ao ano de rentabilidade. Supondo um CDI de 15%, isso representaria 313% do CDI.

Você entende a mensagem que eu quero passar?
Não quero aqui entrar em mérito, fazer juízo de valor de governo, defender o sujo ou o mal lavado. Quero fazer única e exclusivamente com que você invista melhor e ganhe dinheiro.
Acho que, no meio desse mar de decepções, é isso o que podemos fazer: investir melhor e se aposentar com tranquilidade, não dependendo de ninguém.
Eu sei que o seu assessor está te entupindo de crédito privado. É ótimo para ele você ficar totalmente travado nos seus investimentos e não sair mais de lá, em um mercado onde os investidores estão correndo dos assessores e migrando para a consultoria.
Eu sei que o seu private de bancão está mais “conservador”. Claro, o incentivo dele é apenas não perder dinheiro, porque sabe que, assim, você não reclama e ele garante o dinheiro dele.
Ele viu você sacar do seu fundo multimercado quando os caras perderam dinheiro em 2023/2024, sem lembrar que, em 2020/2021, eles te protegeram da perda com a alta de juros. Não há incentivo algum para te fazer correr nenhum risco, porque você mesmo tem dificuldade de aceitar a perda — e, por isso, não ganha dinheiro.
O que isso significa para os investidores brasileiros?
Eu sei que você está há três anos aqui na Nord vendo seu patrimônio alocado em Bolsa patinar um pouco de lado e se perguntando se a gente sabe mesmo o que está fazendo.
Eu sei de tudo isso! Mas quem seríamos nós se acordássemos para a narrativa do mercado?
Quem seria eu se, olhando essa mega tendência lá fora e a chance de você ganhar 400% não insistisse para você abrir mão de um pouco de CDI para tomar algum risco controlado?
Estou falando para você investir tudo em Bolsa Brasil? Não.
Mas um pouco, sim…
Estou falando pra você sair de EUA? Não. Isso é algo que demora 10 anos ou mais para acontecer.
Mas para moderar na duration dos seus títulos de renda fixa, sim…
Estou falando para você colocar um dinheiro em China? Sim, isso sim, com certeza.
Como? Vamos falar mais sobre isso?
Semana que vem na minha live pós-Copom no Instagram (mariliadfontes). Combinado?