Evite novos aportes em crédito privado

O mercado de crédito privado está em alerta. Entenda os riscos, os casos da Ambipar e Braskem e onde investir com mais segurança em 2025

Marilia Fontes 23/10/2025 11:30 6 min
Evite novos aportes em crédito privado

Nas últimas semanas, o mercado voltou a olhar com atenção para o crédito privado, após casos como os da Braskem e da Ambipar. E, sinceramente, esse movimento merece preocupação.

O que está acontecendo é que o mercado de crédito privado no Brasil cresceu rápido demais — e agora carrega um risco estrutural.

O que é crédito privado?

O crédito privado é uma categoria de investimentos de renda fixa em que o investidor aplica recursos em títulos emitidos por empresas ou instituições financeiras, destinados a financiar suas atividades econômicas. Esses títulos podem ser corporativos, como Debêntures, CRIs, CRAs e FIDCs, ou bancários, como CDBs, LCIs, LCAs e LCs.

Nesses investimentos, o investidor é remunerado com juros pelo empréstimo de recursos à empresa ou ao banco emissor, que utiliza esses valores para capital de giro, expansão, projetos ou concessão de crédito.

Ambipar e Braskem revelam fragilidade do crédito privado no Brasil

Duas grandes empresas brasileiras estão no centro de um alerta crescente sobre o risco no mercado de crédito privado: Ambipar e Braskem. Ambas enfrentam crises financeiras sérias que têm afetado diretamente a percepção de risco entre investidores e exposto fragilidades no sistema de dívidas corporativas do país.

No caso da Ambipar, a empresa entrou com pedido de recuperação judicial no Brasil e nos Estados Unidos, após enfrentar uma forte crise de liquidez. A empresa acumula dívida próxima de R$ 11 bilhões e enfrenta uma grave crise de liquidez. O cenário foi agravado por controvérsias envolvendo operações com derivativos, suspeitas de desequilíbrios contábeis e mudanças recentes na diretoria financeira, fatores que ampliaram a desconfiança do mercado.

Apesar de ter feito uma emissão de US$ 750 milhões em “green bonds” no início de 2024, a Ambipar perdeu rapidamente a confiança de investidores, tornando-se um símbolo de alerta para o risco de crédito em empresas altamente alavancadas.

Já a Braskem vem enfrentando uma deterioração acelerada de seus indicadores financeiros. A empresa registrou uma redução expressiva de caixa ao longo de 2024 e 2025, enquanto sua dívida líquida aumentou. As principais agências de rating, como Fitch e S&P Global, rebaixaram as notas de crédito da companhia para níveis especulativos, próximos de “default”, levando a uma forte desvalorização de seus títulos no mercado secundário.

Além disso, a companhia enfrenta entraves na tentativa de venda, com impasses entre controladores e potenciais compradores. Soma-se a isso o passivo ambiental em Maceió, decorrente da extração de sal-gema, que também impacta negativamente a confiança na empresa.

Superalocação e distorções nos retornos dos títulos

Nos últimos anos, o juro alto e as mudanças na legislação empurraram uma quantidade enorme de dinheiro para esse tipo de investimento. 

O “come-cotas” nos fundos exclusivos afastou grandes investidores dos títulos públicos. Depois, as restrições às LCIs e LCAs redirecionaram a demanda para papéis isentos de empresas, como CRIs, CRAs e debêntures de infraestrutura.

O resultado foi um mercado superalocado, com empresas se antecipando para emitir o máximo possível antes da votação da MP 1.303, o que levou a spreads cada vez mais baixos. 

Atualmente, há títulos de companhias com nota máxima de crédito pagando menos do que o Tesouro Nacional. Isso mostra o tamanho da distorção.

E o problema é que, se a situação fiscal do país não for resolvida, as taxas de juros devem continuar altas por muito mais tempo. Nesse cenário, episódios pontuais de recuperação judicial podem facilmente se transformar em algo maior — até em uma crise sistêmica.

O gatilho para uma crise sistêmica

Uma Selic de 15% estrangula a economia e prejudica muito a rentabilidade e até a viabilidade de muitas empresas. Recuperações judiciais e inadimplência crescem a passos largos. E quanto mais tempo esse cenário durar, maiores as chances de contaminação.

O investidor comum é o que mais sofre

O investidor pessoa física, que entrou pesado nesse mercado, é quem corre o maior risco. O crédito privado, ao contrário do que se imagina, não é tão líquido assim, principalmente quando o cenário é de crise. 

Vender antes do vencimento pode significar aceitar perdas de 70% ou 80%. É um mercado em que o jogo é muito mais prevenir antes do problema do que tentar remediar depois, quando, geralmente, já é tarde demais.

Por isso, desde fevereiro de 2024, minha recomendação para novos investimentos no Renda Fixa PRO tem sido clara: evite novos aportes em crédito privado.

Por que evitar novos aportes em crédito privado?

À medida que seus papéis forem pagando juros e amortizações, vá reinvestindo em títulos públicos, que hoje pagam mais e oferecem risco menor.

E não adianta trocar risco alto por risco mais baixo em crédito. Sair de um papel high yield para um AAA privado não resolve. Esses títulos mais seguros estão pagando juros baixíssimos, muitas vezes abaixo dos papéis do próprio Tesouro.

Os fundos de crédito com gestores profissionais também não são uma ótima solução, uma vez que, em um cenário de spreads abrindo, com resgates das cotas, os gestores serão obrigados a liquidarem esses títulos a mercado.

Além disso, fundos cobram taxas de administração que, somadas aos spreads mais baixos, prejudicam muito o retorno desses investimentos.

Um ciclo econômico insustentável

Esse modelo de crescimento adotado no pós-pandemia, com expansão fiscal e juros altos, não está funcionando.

Tem empresa com resultado operacional positivo, mas que fecha o mês no vermelho porque o custo da dívida é alto demais. 

O governo gasta mais, aumenta a dívida, o Tesouro tem dificuldade em se financiar e, para atrair compradores, precisa manter os juros elevados. No fim, o próprio governo acaba tendo que subsidiar as companhias que ele mesmo sufocou com o juro alto. É um ciclo insustentável.

A esperança é que, depois das eleições, o problema fiscal volte ao centro do debate e permita uma queda estrutural dos juros. Mesmo assim, juros abaixo de 10% ainda seriam altos — mas já dariam algum fôlego para a economia.

Onde investir no cenário atual de renda fixa?

A preferência é por títulos pós-fixados de alta liquidez e baixo risco, ideais para reserva de emergência, como Tesouro Selic e CDBs de bancos de primeira linha com liquidez diária. Já para objetivos de prazo mais longo, o destaque vai para investimentos via Tesouro Direto como o Tesouro IPCA 2040

Além disso, vejo o momento oportuno para posições de um pouco mais de risco na Bolsa no Brasil. O Ibovespa B3 acumula valorização de 21% em 2025 (até o dia 22 de outubro) e chegou a bater máximas históricas.

Em paralelo, sugiro cautela com o mercado de crédito privado. Em um ambiente de crédito fácil e juros caros, proteger o patrimônio é muito mais importante do que correr atrás de rentabilidade imediata.

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