Ambipar e Braskem: COEs expõem risco que muitos ignoram
Os casos Braskem e Ambipar acenderam o alerta para os riscos dos COEs sem capital protegido. Investidores perderam até 94% do valor aplicado

Na última quarta-feira, 8 de outubro, o mercado financeiro foi tomado por uma notícia avassaladora. Os COEs (Certificados de Operações Estruturadas) ligados à Ambipar e à Braskem sofreram resgates antecipados por conta de quedas superiores a 50% nos papéis das empresas.
O resultado foi um choque: o investidor recebeu entre 6% e 36% do valor investido. Em outras palavras, uma perda de mais de 60% em algo que, na cabeça de muitos, parecia “controlado”.
A reação foi imediata. Todos — absolutamente todos — os influenciadores de finanças correram para gravar vídeos, abrir lives e postar stories indignados. E não é para menos. O caso virou símbolo do que há de mais perigoso em um produto que mistura complexidade, falta de liquidez e marketing excessivo.
O que são COEs e como funcionam?
Os COEs sempre dividiram opiniões. De um lado, o discurso das corretoras e dos assessores: “uma forma inteligente de acessar estratégias sofisticadas com capital protegido”. Do outro, o alerta dos educadores financeiros: “uma estrutura cara, travada, difícil de entender e, muitas vezes, sem o tal capital protegido”.
Os COEs, afinal, são produtos híbridos, que combinam renda fixa e derivativos. O objetivo é permitir ao investidor participar da alta de um ativo (como uma ação, uma cesta de empresas, uma moeda ou até um índice estrangeiro), com um nível determinado de proteção contra perdas.
COEs têm ou não têm capital protegido?
O problema é que essa “proteção” muitas vezes só existe no papel — e não cobre todos os cenários.
Quando o produto não tem capital garantido — como nesses casos recentes —, o investidor pode, sim, perder quase tudo.
Mas então fica a pergunta: se o produto é tão pouco atraente em termos de risco e liquidez, por que tantos clientes tinham 30%, 40% ou até 50% da carteira em COEs?

O papel das comissões na venda de COEs
Aqui, não é preciso florear. O modelo de distribuição empurra o assessor a vender o que mais paga comissão.O COE, por natureza, é um produto com gordas margens de remuneração. Enquanto um Tesouro Direto ou um CDB simples paga pouco ou nada ao distribuidor, um COE pode render de 3% a 7% do valor aplicado em comissões.
Multiplique isso por centenas de clientes e você entende por que as mesas de assessoria se apaixonaram por ele.
O resultado foi previsível: o COE virou o produto da vez, aquele ativo que todo mundo oferecia sem que o cliente realmente entendesse o que estava comprando.
A reação do mercado financeiro
Quando alguém critica o modelo, vem o contra-ataque.
Basta um post ou uma crítica mais contundente para surgir uma tropa de assessores organizados, comentando em massa, defendendo o produto e atacando quem ousa dizer o óbvio: que há conflito de interesse.
Isso me lembra muito o que aconteceu quando a Uber chegou ao Brasil: os taxistas se revoltaram, queimaram carros, fizeram protestos.
A tecnologia era inevitável, mas eles se agarraram ao modelo antigo. No fim, quem decidiu o que funcionava melhor foi o consumidor. O mesmo vale para o mercado financeiro.
No fim das contas, quem vai escolher o modelo vencedor é o cliente — e ponto.
Pagar diretamente pode valer mais a pena
Será que é melhor pagar diretamente pela consultoria, em vez de deixar que o assessor receba da corretora pelos produtos vendidos?
Eu acredito que, para a grande maioria das pessoas, sim. Mas é claro que esse modelo não serve para todos.
Alguns clientes gostam da sensação de ter alguém “no ponto de táxi” — aquela pessoa de confiança que está sempre ali, pronta para ajudar, que conhece o histórico, que liga de tempos em tempos — e isso tem valor real.
Outros preferem a “Uber”: a liberdade de escolher, comparar preços e mudar de motorista se a corrida não for boa.No mundo dos investimentos, essa escolha se traduz entre assessoria comissionada e consultoria independente.
Cada modelo tem prós e contras. A diferença é que, no segundo, você sabe exatamente quem está te pagando.
O conflito de interesse nunca desaparece — mas pode ser reduzido
A assessoria tradicional vive do que ganha com os produtos que vende. Mesmo quando tenta “melhorar o modelo”, oferecendo um fee fixo, ainda há limitações.O problema não é só de remuneração: é também de estrutura regulatória.
Por lei, o Agente Autônomo de Investimentos (AAI) não pode fazer recomendações próprias — ele apenas apresenta os produtos da corretora dentro de um perfil de suitability.
Ou seja: ele não pode dizer o que é melhor; apenas o que é “adequado” dentro do que a corretora tem.
É como se o médico pudesse prescrever só os remédios do laboratório onde trabalha — ainda que houvesse alternativas melhores fora dali.
Mas o outro extremo também preocupa.
Há consultorias que se dizem independentes, mas não têm equipe de análise própria. De onde vêm as recomendações, então?
Quem garante que não há uma dependência indireta das mesmas casas de research que alimentam os assessores?
O modelo fee-based com research independente
Aqui, na Nord, nós escolhemos o caminho do meio — o modelo de consultoria fee-based. Quem nos paga é o cliente. E ponto.
Não recebemos comissão de produto e as análises vêm de uma área de research 100% independente, com analistas que não participam da venda nem da execução.
Isso elimina grande parte dos conflitos e permite o que mais importa: recomendações sinceras, alinhadas ao interesse do investidor.Não é o modelo perfeito — nenhum é —, mas é o que mais se aproxima de uma relação de confiança genuína, na nossa opinião.
E os resultados falam por si.
Nosso NPS (Net Promoter Score) mostra que os clientes da Nord entendem essa diferença e reconhecem o valor de pagar por uma orientação sem amarras.
Créditos privados: a nova armadilha dos juros altos
Enquanto os COEs dominam as manchetes, há outro risco crescendo silenciosamente nas carteiras: o dos créditos privados.
Com a Selic em patamares elevados, eles voltaram a brilhar.
CRIs, CRAs, debêntures incentivadas — todos pagando taxas sedutoras. Mas o investidor esquece que juros altos são sinônimo de mais inadimplência.
Nesta semana mesmo, o CRA da Patense convocou seus investidores para uma decisão difícil: aceitar receber apenas 15% do valor de face em 15 anos, com juros anuais de 1,5%, ou entrar na Justiça para tentar executar as garantias, com risco de sucumbência de R$ 50 milhões e exigência de aportes adicionais.
Um dilema cruel — e um lembrete de que nem tudo que brilha em crédito é ouro.
Muitos desses títulos são vendidos como “renda fixa”, mas o nome engana: não há nada de fixo em um crédito ruim. Quando uma empresa quebra, o papel que pagava CDI + 4% vira pó.
E se até gestores profissionais erram, imagine o investidor pessoa física, que, muitas vezes, compra sem entender nem quem é o emissor.
Mesmo para nós — que temos uma equipe dedicada só para analisar crédito —, há casos em que a deterioração acontece rápido demais.
Empresas mudam, os controladores mudam, o cenário muda. O que era um bom risco em 2022 pode ser um desastre em 2025.
O investidor precisa voltar a fazer perguntas
A crise dos COEs e o aumento dos calotes em crédito privado têm algo em comum: a falta de questionamento.
Durante anos de juros baixos, o investidor se acostumou a confiar cegamente em quem “apresentava o produto”.
Mas agora, com o dinheiro mais caro, cada decisão tem peso e o mercado cobra caro pelos erros.
A pergunta que o investidor deveria se fazer não é “quanto rende?”, mas “quem ganha com isso além de mim?”
Se a resposta for confusa, isso significa que o risco é maior do que parece.
O caso dos COEs sem capital protegido é, na essência, um lembrete duro sobre o preço da conveniência.
Muitos investidores compraram esses produtos porque era mais fácil confiar no assessor do que tentar entender a estrutura.
Era mais confortável delegar a responsabilidade do que estudar.
Mas, no mercado financeiro, essa atitude pode custar caro — e a responsabilidade, inevitável.
Assim como os taxistas tiveram que se reinventar após a Uber, o investidor também precisa se adaptar a um novo mundo.
Um mundo onde a transparência vale mais que promessas e onde a verdadeira proteção não vem do produto, mas do conhecimento.
No fim do dia, não existe investimento sem risco. Mas existe, sim, o risco de investir sem entender.
E esse, como os COEs da Ambipar e Braskem mostraram, é o mais caro de todos.